31 de dezembro de 2006

Clara, a mulher das flores


Todo dia da minha janela vejo Clara passar.


Clara ia e vinha todo dia. O sol, ainda menino, acompanhava seus passos firmes.
Pisando na terra, flores na cabeça e felicidade no peito.
Não sabia muito sobre o lado de lá do mundo.

Menina que era, sonhou ir para cidade grande, andar de escada rolante e procurar um homem.
Seu nome era João de Deus. O homem, diziam, era português.
Não tinha muito sotaque, mas falava palavras lindas e misteriosas.
A mãe de Clara se encantou por seu mistério.

Ouviu as histórias sobre a lua e chorou.
Apoiada na barriga contou os dias e perdeu a conta das lagrimas esperando João.
Muitas flores cresceram junto com Clara,
que chegou ao mundo comao uma estrela cadente em noite de lua cheia.Aprendeu com a mãe a cultivar sorrisos coloridos como flores do mato.

“As flores minha filha, são sorrisos de Deus, brindam a felicidade e escondem a tristeza.”

Por mais de vinte anos Clara ajudou a mãe a arrumar a sala com jasmin perfumado a espera do pai.
Até o dia em que sua mãe partiu, deixando na casa, seu corpo cansado e o perfume das flores nas mãos.
No lugar de lagrimas, gotas de chuva molharam o jardim.

No cemitério, apenas ela e o coveiro.
Sem ninguém para chorar com ela, resolveu guardar sua tristeza.
O coveiro, que era também jardineiro, pegou sua mão e como não sabia falar bonito, falou em silencio palavras que não conhecia.

Clara ainda não sabia, mas João, o jardineiro, nunca mais largaria sua mão.
Hoje, trinta e oito anos depois, Clara ainda anda de pés no chão.
Ainda acorda com o sol e não conhece as letras, mas não espera mais um João.
Na volta para casa, quem a espera é ele, que vem buscá-la na cidade cheio de flores nas mãos.

Um comentário:

bruni... disse...

Que história tocante...
A pessoa da foto é a Clara?
No post acima vc disse que inspiração não faltara, to pronto pra ler tudo isso... rs