22 de maio de 2010

Adolescência Analogia

Trim. Era este o som do telefone. Logo depois o suspense.
Quatro irmãs esperando quarenta mil telefonemas.
O aparelho ficava na sala, o outro na cozinha. 

Intimidade era coisa de cinema.
Lá em casa todos sabiam quem ligava para quem. Se alguém quisesse sair com uma de nós, era preciso ligar, engolir seco e cumprimentar quem quer que atendesse , normalmente minha mãe.

Nessa via crucies o adolescente sofria, ficava vermelho, ensaiava na frente do espelho e depois finalmente, entendia que dava conta do recado. Crescia. Aos poucos ia virando homem e com o tempo já chegava na casa da namorada com um buque de flores na mão, não para ela, mas para a mãe. E ali nasciam príncipes e malandros, de qualquer forma aprendiam a dar seus passos sozinhos.
A sala de estar era uma espécie de sala da justiça, todos se encontravam depois de suas super tarefas para discutir ou contar suas estórias. A TV, também única na casa mostrava sempre os mesmos programas que serviam como marcadores de tempo. Jantar depois do Jornal Nacional, cama depois da novela. Ouvir a musica do super cine era alerta geral. Ou os pais poderiam acordar ou chegar a qualquer momento e ai de quem não estivesse na cama.
Nossa vida parecia mais ritmada, ensaiada. Tínhamos a impressão, e era verdade, de não ser possível deixar nada para resolver depois. Programávamos tudo minuciosamente. Quando saíamos, marcávamos com antecedência, as vezes dias de antecedência. A ansiedade era diferente. Era boa. Não dava para ficar mudando o programa toda hora, afinal o tal celular ainda estava na ficção. Avisar todo mundo era parte do dicersão. De alguma forma a falta de tudo o que hoje nos ajuda a programar nossas vidas, fazia dela muito mais programada.
A realidade era analógica.
De all star e walkman amarelinho, caminhávamos mais leves. Tirávamos fotos que ficavam guardadas dentro da câmera até revelarem as lembranças

de cada momento. Depois, não adiantava inventar moda. Foto, naquela época, não voava de janela em janela. Marcávamos reuniões na casa de alguém. Quase sempre na minha, de preferencia ouvindo Barão Vermelho, Paralamas ou Ultraje a Rigor. Nós vamos invadir sua praia!. O Victor meu cozinheiro fazia o melhor bolo de cenoura com calda de chocolate da cidade. A turma se reunia, nossos pais se conheciam, os porteiros, os vizinhos, os donos do mercadinho, as pessoas eram gente de carne e osso e não fotos no computador.
Medo era levar ovos na cabeça no dia do aniversário. Também tinha pavor da cena do gordinho dos Gonnies com a mão no liqüidificador. Esta era nossa noção de tortura. A Cuca, do Sitio do Pica-pau Amarelo era o pior monstro. E os smurfes? Da para acreditar que o Gargamel era um vilão?
Nossos heróis, o Juba e o Lula inspiravam os meninos e a Zelda Scott, bem, ela era a subversão de todas as meninas. Como esquecer as faxinhas pretas sobre o corpo nu da mulher mais avançada da minha adolescência? Todas queriam namorados Jubas e Lulas mas ninguém nunca assumiria o pecado de ser a Zelda. Era demais para aquele tempo.
Era tempo de ter tempo. De sonhar com o nosso futuro e nao rezar para que o mundo sobrevivesse ao presente. Era tempo de ir ao cinema assistir Karate Kid e os inesquecíveis Caça Fantasmas. Curtindo a Vida Adoidado era a síntese do que gostaríamos de viver e quantas loucuras me inspirou, a pior delas, cabular aula e me esconder no Shopping comendo balinhas das Lojas Americanas.
Os quinze anos se foram junto com os chicletes azedinho doce, cigarrinhos de chocolate pan, pirulito Dip Lik, o genius, o atari, e a bala de leite kids, a melhor bala que existe.
E foi deste mundo onde crianças pulavam amarelinha, jogavam queimada e brincavam de estatua em ruas de portas abertas que nasceu a menina que, de dentro de mim, lembra hoje com saudades de um tempo escondido entre os anos oitenta e noventa, um lugar tão mágico quanto a musica das Olivetti escrevendo nossos sonhos. 

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