30 de agosto de 2006

Maria Das Bonecas

17/05/2005


Boa Esperança era uma daquelas cidades, em que o tempo parou, se é que algum dia chegou a passar por lá.
As calçadas ainda eram altas conforme a porta dos ford 1920 que cruzavam as ruas de paralelepípedo sob o olhar atento das senhoras que das janelas assistiam a vida passar.
O único cinema da cidade, ficava na rua de frente ao casarão cor de rosa de meus avós, fechou no mesmo mês da inauguração por falta de público.
A igreja, imersa em montanhas de areia e dívidas, de uma construção eterna comandadas por um padre que aguardava seu lugarzinho no céu em uma linda fazenda construída do cimento dos fiéis.
Um detalhe, porém, fazia da pacata cidade ser mais que um presépio em tamanho natural;um hospício!
Julho era mês de férias para mim, e também para eles, os “loucos” que na falta de família acabavam vagando pelas ruas.
Uma tarde saí para comprar sorvete e percebi que tinham chegado, a primeira que vi foi Maria das Bonecas. Andava com bonecas amarradas por todo o corpo, além de uma no colo ,chamada por ela de filhinha.
Aquela mulher a quem todos chamavam de maluca, me olhou nos olhos e eu olhei de volta.
Senti uma dor imensa presa nas roupas sujas, no corpo cansado de se apoiar em nada. Ela me falou alguma coisa, mas o turbilhão que invadiu minha mente impediu-me de ouvir .Foi neste instante que um pensamento começou a me incomodar e por muito tempo me seguiu.
Se ela fosse uma criança cheia de bonecas, não seria louca, quem sabe seu corpo cresceu e a alma se perdeu?Senti um medo gelado que me mandou crescer por dentro para não ficar como ela e naquele dia, ainda com dez anos joguei fora todas as minhas bonecas.

Nenhum comentário: